25 fevereiro, 2006

Sexta monocromática

Apatia - do Lat. apthia + Gr. apátheia
s. f., insensibilidade; indiferença; impassibilidade; inércia; marasmo.


Hoje não ventou, o ônibus não fez barulho, não tomei esporro no trabalho, nem fui elogiado. A menina que me dá bola não deu. Cada risada foi um grunido de desespero, que afinal não veio.Não choveu, as músicas não desceram. Tive vontade de ir pra casa ver novela, ou pior, sessão da tarde.

Quis beber, mas não servia cachaça/wiski/vodka - muito fortes. Não desceria cerveja/chopp/long neck - não fazem efeito. Não era clima para misturas/batidas.
"Então uma droga", pensei. Maconha - muito depressivo. Ecstasy - muito agitado. Cocaína - muito suor. Cigarro - muito morno.

Morno - do Germ. morn.
Adj.,pouco quente; tépido;
Fig., falto de energia, mole; insípido.


Sexo.
Os dois do mesmo jeito, sem querer nada a não ser que o dia acabe. Ou nem isso. Eles se olham. Ela com os cabelos soltos, os olhos meiados, a boca entreaberta. Blusa de alcinha e saia rodada acima do joelho. Ele com os cabelos soltos, lisos, quase até os ombros. O olhar alcançando a boca dela. Desejando que ela movimente a língua contra o céu da boca. Camiseta e bermuda jeans.

As pernas se tocando por baixo da mesa de vidro dariam um espetáculo caso alguém os obsrvasse pelo outro lado. O arrebol que entra pela janela e bate na parede amarelada deixa na copa um clima de filme antigo. "Hell is around the corner" chia no toca discos lá na sala.

Os olhos correm pelas suas curvas. A imaginação pelo desejo. Ela faz o primeiro movimento. Aproxima-se do rosto dele e encosta bochecha com bochecha. Tão levemente que um arrepio sobe pelas suas costas. Ele, respondendo à esta carícia, faz círculos com a mão esquerda no joelho direito dela.

Seus lábios se tocam. Os dela macios e tenros como um pêssego. Os dele secos e frios pela respiração ansiosa. O beijo como quem quer engolir algo maior que a boca. O calor sobe de raiva. As roupas sao arrancadas e espalhadas pela casa como se quando virem-nas novamente elas fossem dizer que valeu a pena.

Mas o tempo não passou, o vento não veio e nem o mormaço, nem o marasmo foram embora.

05 fevereiro, 2006

Material para postagem

Um pouco de função conativa.
Que tal escrever sobre o por quê é tão mais fácil escrever quando se está deprimido? Talvez porque o "mal deste século" é, como o nome indica, compartilhado por tantas pessoas que, enquanto escreve, a certeza de que será aceito permeia cada palavra. Ou então escrever sobre a prepotência de que será lido por tantas pessoas assim, sobre a incongruência do desejo de escrever e, com a mesma força, o medo de ser lido. Cada autor sofre de diferentes graus dessa página (fina, branca, de papel, cortante, fria... ou então embolada, amarela, dura, maciça e pesada... quem sabe ainda aquela de papel reciclado, que acabou de sair da peneira e ainda não vê sentido em ser... meu deus, como eu posso me esquecer dessa de vidro, com milhares de micro formigas se movimentando para todos os lados com o simples clicar de um mouse, essa que te dá a impressão de controle sobre algo menor e mais fraco que você...).
Poderia-se ainda escrever sobre o acaso. Uma música que se estava apaixonado e, de tanto ouvi-la, enjoou. Acontece que enquanto começa a escrever naquela página amarela de maché, com toda a densidade que ela exige, notas são reconhecidas pelo seu sistema mais profundo... o tímpano. Aquela música exaustivamente explorada se excita em meio a pensamentos e ondas sonoras logínquas.
Quem sabe, escrever sobre a definição de amor. Uma bobagem que se sente após uma onda de paixão, ou um complexo de sentimentos nos quais a dor geralmente é o mais proeminente, ou ainda uma sucessão da doença que tira as pessoas do seu normal (e de qualquer outro normal) que é a paixão. Neste caso uma doença ao cubo, ou até à sexta potência.
A inutilidade de um domingo é sempre um ótimo assunto. Isso sem entrarmos no mérito do Faustão e do Gugu. Um domingo sem televisão. Aqueles nos quais se fica deitado curtindo o por do sol, aquela sensação gostosa de fim de tarde, o início do desespero da segunda chegando, a impaciência de não se ter nada que se queira fazer e o querer proeminente de se fazer algo. A magnitude do início daquela noite perdida, assim como foi o dia, uma vez que você dormiu mais do que gostaria. Obviamente eu não estou contando com as inúmeras possibilidades de um dia ótimo uma vez que nós fomos à feira hippie (no meu tempo conhecida como feira de artesanato). Mas se eu estivesse, aquele filme que você espera há tanto entra em cartaz. Há programa melhor que esse? Feira hippie, almoço (provavelmente num bu-raco-teco), vadiar até a hora do filme tão esperado (o quê? talvez umas 2 horas? 3, no máximo!?), pegar a sessão de cinema por volta de 6 horas e sair do filme já à noite. Como eu disse, prá onde foi o seu tão merecido domingo?
Pressão? Qual? Se você tem problemas com os pais ninguém tem nada a ver com isso. Se o seu emprego não te valoriza, por que não o larga? Ouvir músicas que não gosta só para agradar a outrém... como num papo na noite. Uma conquista, talvez. Falar de música é sempre bem-vindo. Mesmo que você não goste, há a desculpa: "não, EU CONHEÇO! JÁ OUVI! mas não é minha praia...". Ora, escrever por prazer coisas que não serão publicadas e não conseguir eliminar a tentação de expô-las. Porque você tenta. Sabe que sim.
Escrever sobre a leveza de um texto. Aquela leveza às vezes esperada e procurada, mas sempre tão distante que a procura por ela te densifica mais do que se você deixasse viver, deixasse ficar, deixasse estar como está. Você acabaria esbarrando nela e, com um golpe de sorte, ao invés de só esbarrar nela, você a albarroa.
"Relaxe. Respire fundo. Três vezes.... Isso. Não se esqueça de manter os olhos fechados. Mesmo porque eles já estão tão pesados que não seria possível abri-los nem se quisesse..." Meditação... Um espaço em preto na correria de suas divagações melancólicas. Uma folha arrancada da declaração da independência.
Engraçado, não consigo finalizar esse post. Até mesmo o fim é um ótimo tópico para ser discutido. Aquele fim que chega e não se percebe. É necessário um aviso. THE END. Mas eu prefiro um fim sutil, que chega como não quer dizer nada. E realmente não diz.

02 fevereiro, 2006

Andei atordoado

A vontade de ter uma rotina casa-trabalho-casa me persegue. A vontade de, por comparação à outras vidas, sair e me divertir 24/7 existe. A angústia de não saber qual das duas opções seguir tb.
A vontade de ter alguém me aflige. O desejo de me conhecer melhor pulula. A angústia de não saber qual das duas opções seguir tb.
A vontade de ligar pros amigos p sair, tomar uma, bater um papo, passar mais tempo com eles me abraça. A impaciência de conversar após atender help desk me explode (quero casa). A angústia de não saber qual das duas opções seguir tb.
A impressão de só ter conversas fúteis e sem sentido ainda me consome. A vontade de extrapolar esse sentimento me impulsiona. A angústia de não saber qual das duas opções seguir tb.
A vontade de ajudar a todos que me ligam pedindo suporte me alegra. A noção de responsabilidade pós-ajuda me deprime. A angústia de não saber qual das duas opções seguir tb.
A experiência de ficar deprimido me extasia. O desejo de fazer disso rotina me fode. A angústia de não saber qual das duas opções seguir tb.
A sensação de estar conquistando alguém me entristece. A certeza de não ter quem eu quero me alegra. A angústia de não saber qual das duas opções seguir tb.
A depressão de estar angustiado me felicita. A felicidade de estar deprimido me angustia. A falta de escolha me arrasa.

O Último Dia

Meu amor,O que você faria
Se só te restasse um dia
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria?

Ia manter sua agenda
De almoço, hora, apatia
Ou esperar os seus amigos
Na sua sala vazia?

Meu amor, o que você faria
Se só te restasse esse dia
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria?

Corria prum shopping center
Ou para uma academia
Pra se esquecer que não dá tempo
Pro tempo que já se perdia

Meu amor, o que você faria
Se só te restasse um dia
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria?

Andava pelado na chuva?
Corria pro meio da rua?
Entrava de roupa no mar?
Trepava sem camisinha?

Meu amor, o que você faria, hem?
O que você faria?
Abria a porta do hospício
Trancava a da delegacia?
Dinamitava o meu carro?
Parava o tráfego e ria?

Meu amor, o que você faria
Se só te restasse um dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria?

(na voz de Lenine, por favor)